“O mundo falhou”. Com essas palavras, o presidente equatoriano
Rafael Corrêa anunciou, em cadeia nacional, o fim do Projeto ITT Yasuní (campos
Ishpingo, Tambococha e Tiputini), que preconizava manter o petróleo desta
Reserva da Biosfera e Parque Nacional debaixo da terra “pela perpetuidade”, em
troca de uma compensação financeira por parte dos países desenvolvidos estimada
em US$3.600 milhões, durante 13 anos.
O projeto foi lançado e aclamado no Equador e pela comunidade
internacional, há seis anos, e se baseava em quatro premissas: 1 – mudar a
matriz produtiva do país baseada na exploração petroleira; 2 – conservar a
biodiversidade do Parque Yasuní, considerado uma das dez áreas mais ricas em
biodiversidade no mundo; 3 – proteger os povos Huaorani e seus clãs Tagaeri e
Taromenane, em isolamento voluntário, e 4 – mitigar os efeitos do aquecimento
global no mundo.
O Parque Yasuní, além da incrível biodiversidade, abriga no
seu subsolo aproximadamente 846 bilhões de barris de petróleo e tem sido um
alvo cobiçado por empresas petroleiras, entre elas a Petrobras, que detinha o
monopólio do bloque 31, localizado no interior desta Unidade de Conservação.
Em 2006, após protestos em todo o País contra a Petrobras, e
denúncias veiculadas na imprensa equatoriana e por parte de alguns setores da
sociedade brasileira (a Fase lançou um livro acusando a Petrobras de “duplo
padrão” ao tentar fazer no Equador o que ela seria proibida no Brasil), a
empresa anunciou a devolução do bloque 31 ao Estado equatoriano.
Após três anos da criação de um fundo junto à ONU para receber os aportes, a
iniciativa alcançou apenas US$13.3 milhões em depósitos concretos, enquanto que
outros US$116 milhões ficaram sob compromisso.
O anúncio gerou uma onda de protestos no País: além de marchas
em cidades da Amazônia equatoriana como Puyo, neste sábado (17), em Quito
centenas de manifestantes se aglomeraram em frente ao Palácio do Governo, neste
domingo (18), exigindo que se faca uma Consulta Popular para que a decisão seja
definida pela população.
Roque Sevilla, que liderou a comissão técnica do projeto
Yasuní-ITT até 2010, sustenta que o fim da iniciativa, na verdade, se deu por
causa de uma política ambiental controversa por parte de Corrêa: no momento do
anúncio da Iniciativa ITT, o presidente deu a conhecer a opção B, que previa a
exploração do ITT caso o fundo não atingisse o patamar esperado, o que teria
desanimado alguns países interessados em contribuir.
Além disso, setores ecologistas denunciam outra contradição:
pouco depois do anúncio da Iniciativa ITT, o presidente anunciou a criação de
uma empresa estatal para explorar minerais no País, em zonas frágeis da Amazônia
como a Cordilheira do Côndor, território dos índios Shuar, entre outros de
cultura ancestral.
Nas palavras de Corrêa "a pior crise econômica global dos últimos 80
anos" teria sido uma das causas do fracasso, enfatizando que "o fator
fundamental é a grande hipocrisia do mundo, e a lógica que prevalece não é a da
justiça e sim do poder".
Segundo uma empresa de pesquisas de opinião, a Perfiles de Opinión, em junho
de 2013 um total de 93% da população equatoriana em Quito e Guayaquil estavam
de acordo com a Iniciativa Yasuní-ITT e 66% não apoiava a exploração, em caso
de que não fossem conseguidos suficientes fundos.
Salvador Quishpe, governador de Morona Santiago, expressou em sua conta no
Facebook que a Consulta Popular não é o caminho para reverter a decisão, já que
estes povos estão assegurados pela Constituição aprovada em 2006, em Monte Christi,
que estabeleceu, em seu artigo 57:
"Os territórios dos povos em isolamento voluntário são de posse
ancestral irredutível e intangível, e neles está proibido todo tipo de
atividade extrativista".
Para Alberto Acosta, ex-presidente da Assembleia de Monte Christi e ex-ministro
de Minas e Energia no governo de Corrêa, o fracasso é de responsabilidade,
primeiramente, do próprio presidente.
“Não era apenas um projeto econômico. Era um passo gigante na trilha do
pós-extrativismo e, sobretudo, era um projeto ético, politicamente ético, no
qual se envolviam os direitos de grupos vulneráveis e os direitos da natureza,
previstos na Constituição, e que têm sido minimizados pelo presidente da
República”, afirma um dos maiores entusiastas do projeto.
Por Anppa
Fonte: BBC e Rede Brasil Atual